29 de out. de 2009

Sobre o Conceito de Esclarecimento – Immanuel Kant

“Esclarecimento (Aufklärung) significa a saída do homem de sua minoridade, pela qual ele próprio é responsável. A minoridade é a incapacidade de se servir de seu próprio entendimento sem a tutela de um outro. É a si próprio que se deve atribuir essa minoridade, uma vez que ela não resulta da falta de entendimento, mas da falta de resolução e de coragem necessárias para utilizar seu entendimento sem a tutela de outro. Sapere aude! Tenha a coragem de te servir de teu próprio entendimento, tal é portanto a divisa do Esclarecimento.”

A citação acima foi retirada do texto “Resposta à pergunta: O que é esclarecimento?” Escrita por Immanuel Kant em 1783. Período de Iluminismo em combate ao Absolutismo, Kant defende a instauração do domínio da razão e da liberdade.
Encontrando-se na característica de minoridade, o homem acredita não ser capaz de agir por conta de seu próprio entendimento, talvez por preguiça e falta de interesse no pensar ou até mesmo por covardia, todavia, não significa que ele não tenha capacidade ou conhecimento. Procuram então, alguém que possa pensar por eles, deixam a própria responsabilidade a trabalho de outros e conseqüentemente se tornam escravos dos pensamentos de seus responsáveis. Essa situação acontece com a maior parte dos seres humanos, eles se acostumam, sentem-se seguros e dificilmente conseguem sair desse casulo, formado por eles mesmos. São incentivados a continuar pelos responsáveis que não tem interesse nenhum em perder seus “escravos”. Mesmo aqueles que não têm conhecimento, mas são livres para pensar, acabam se influenciando e embora se livrem do despotismo pessoal (através de uma revolução), não sofrerão grandes alterações na maneira de pensar.
Já a liberdade ilimitada unida ao conhecimento provoca o Esclarecimento. O problema é que a liberdade constantemente sofre a imposição de limites, por isso o número de pessoas “esclarecidas” e muito menor do que o número de pessoas que permanecem na minoridade. Os responsáveis pelas leis impõem regras que limitam a liberdade, os líderes de igrejas limitam a liberdade e muitas outras entidades moralistas também colocam bloqueios na liberdade.
O uso público do pensamento livre, ou seja, para fins pessoais, deve ser ilimitado, pois nesse caso não há ninguém a ser representado (ex. um pastor fora de seu posto, pensando por si). Já o uso privado da liberdade deverá ter limites, pois o usuário estará representando uma entidade de opiniões já formadas e limitadas (ex. o mesmo pastor ao representar sua igreja só irá obedecer). O mesmo indivíduo poderá usar as duas formas de liberdade, em situações distintas.
Uma sociedade esclarecida jamais poderá impedir que seus descendentes tenham sua liberdade totalmente bloqueada ou impedida, pois uma geração sempre será mais evoluída do que a anterior e não se prenderá a conceitos antigos. Impor pensamentos numa sociedade é como violar seus direitos naturais. Não podemos dizer que nosso período é esclarecido, entretanto estamos descobrindo aos poucos, e o esclarecimento está acontecendo gradativamente. É claro que a maior parte em minoridade está relacionada com religiões, pois há grande interesse por parte dos líderes de igrejas. A quantidade imensa também está relacionada à diversidade, mas principalmente a falta de interesse do homem de pensar por si próprio. Além de ser a mais prejudicial é a mais desonrosa. O homem, que deveria pensar livremente e raciocinar por si próprio, diante dessa situação, torna-se “massa de manobra” ou “boneco” nas mãos de mais esclarecidos interessados.

8 de out. de 2009

A Política do Poder (Cap. VI e VII)

Poder Marítimo e Poder Terrestre

O sistema de Estados surgiu na mesma época das Grandes Descobertas e do início do uso regular de armas nas guerras. O uso marítimo contribuiu para que artilharias fossem transportadas, graças aos Portugueses que iniciaram esse processo e aos Ingleses que também o fizeram e, provavelmente, inventaram o encouraçado, além de desenvolverem o uso político do poder marítimo.
Já que o planeta é constituído de muito mais água do que terra, quem possuísse a maior potência marítima teria mais chances na guerra do que quem possuísse territórios em terra. Permitiria que uma potência exercesse pressão em qualquer país que possuísse costa, independente de tempos de guerra ou paz, pois teria mais liberdade de agir. Permitiria também que ao país dominante desembarcar ou manter forças militares no lugar que mais lhe interessasse em território inimigo, e retirar para lutar em outro lugar caso necessário. Grandes alianças lideradas por potências marítimas derrotaram potências continentais, pois possibilitou que tais alianças fizessem a guerra nos locais escolhidos e que impedissem o comércio dos seus inimigos. Nenhuma outra forma de ataque destruiria uma nação inteira com tanta sofisticação quanto os que utilizavam o mar.
Acontece que, tanto os derrotados quanto os dominantes do poder marítimo, deram importância demais a ele. Sabe-se que, em muitos casos, algumas potências detentoras do poder marítimo foram derrotadas em terra e que algumas vitórias do poder marítimo não passaram de circunstâncias propícias. O poder marítimo previu a existência de poderes terrestres, e não foi recíproco. Parecia haver artificialidade no poder marítimo, quem conseguisse o maior domínio da terra, poderia também ter o domínio dos mares devido ao crescimento industrial de algumas potências e a revolução do transporte terrestre mecânico.
Mackinder cita alguns argumentos a favor desta opinião: 1) o poder marítimo encobre a incapacidade de existir sem raízes territoriais, afinal, não há como manter esse poder se não houver sustentação terrestre, e a potência que tiver os melhores recursos em terra poderá controlar os mares; 2) através da história, os detentores do poder marítimo esconderam sempre que suas bases foram conquistadas pelo poder terrestre, Mackinder acreditava que era muito mais fácil o poder terrestre lançar-se ao mar do que o poder marítimo lançar-se a terra; 3) A expansão externa da Europa, para qual o poderio marítimo havia sido o grande instrumento, já havia terminado, e outras sucessivamente; 4) o fechamento de fronteiras do mundo trouxe nova perspectiva geográfica, o “Velho Mundo” já podia ser considerado unidade estratégica; 5) os dois acontecimentos que tornaram o “Velho Mundo” uma unidade estratégica, as revoluções nos meios de comunicação terrestre e o crescimento da população, que causou a falta de poder humano adequado; 6) a área “pivotal” do mundo era inacessível à navegação marítima; 7) o triunfo da Primeira Guerra Mundial foi acidental e ilusório, pois a estratégia política da guerra havia sido a única na história européia; 8) a verdadeira lição da Primeira Guerra Mundial foi um aviso a respeito do aumento das oportunidades estratégicas do poder terrestre em relação ao poder marítimo; 9) a Heartland possui pouca região fronteiriça natural com a Europa a oeste e o controle da Europa oriental leva ao controle da própria Heartland.
A princípio parecia que as idéias de Mackinder haviam sido confirmadas, pois a teoria do poder terrestre estava baseada em evidências históricas seletivas, diferente das teorias marítimas. Ele dava a impressão de que todas as potências marítimas tinham sido conquistadas pelas potências terrestres, mas ignorava potências navais que eram derrotadas por outras potências navais; e também as potências dominantes em terra e mar que perderam domínio por causa da decadência interna e por potências navais mais fortes.
A primeira Guerra Mundial confirmou as teorias terrestres e o início do poder aéreo. Havia os partidários do poder aéreo que argumentavam que, já que o poder marítimo atingia maior parte do planeta por ele ser formado em sua grande maioria por água, então o transporte aéreo era mais eficiente por envolver tanto terra quanto água. Quem inaugurou esse espaço como fonte de bombardeios foi a Alemanha, e outros países e potências desenvolveram esse uso.
A Segunda Guerra Mundial confirmou a eficiência do poder aéreo, mas não da teoria ortodoxa do poder estratégico, ou seja, não quer dizer que poderia garantir a vitória de ninguém na guerra.
Com o desenvolvimento da comunicação e unificação do mundo, tornaram-se dispensáveis certas discussões sobre a equivalência dos três tipos de poder, mesmo porque eles estão cada vez mais sendo utilizados em conjunto e tornando-se interdependentes. O transporte aéreo só veio acrescentar os outros, embora ainda um pouco limitado por questões de limitação de peso e necessidade freqüente de reabastecimento.

Revoluções Internacionais

As questões de política internacional estão relacionadas não somente à massa e peso, armas e matéria-prima, mas também a opiniões e ideologia. Nenhuma delas prevalece sozinha se não estiver relacionada ao poder.
Revolução significa a mudança repentina de poder em um único Estado. Ela pode ser internacional ou nacional, e no último caso pode causar repercussões em âmbito internacional. Ao analisar o histórico internacional, com base na ideologia e fanatismo, podemos citar três situações: a Reforma; a Revolução Francesa; e a Revolução Russa. Os objetivos dessas situações estavam ligados a paixões religiosas e ambição de governar politicamente o mundo.
A época da política do poder sem influência doutrinária foi a de Luís XIV até a Revolução Francesa, pois as guerras passaram a ser restringidas aos seus objetivos originais do Estado e porque havia equilíbrio temporário de poder. Os Revolucionários franceses é que voltaram a implantar seus ideais no Estado a partir da Revolução, foram atacados por potências que não concordavam com esses ideais. Mas, essas potências também não tinham propostas positivas para oferecer e acabaram gerando novos conflitos, descumprindo novamente os fundamentos do Estado.
A idéia de equilíbrio parece não ter sobrevivido e ainda encontram-se marcas espalhadas pela Revolução. Embora o século XIX pareça estável internacionalmente, isso se deve ao fato de que o tumulto revolucionário não causou guerra total, e foi seguido por um período de paz. Havia um combinado de estabilidade com flexibilidade e progresso com segurança no sistema das relações internacionais. O objetivo da Revolução era reconstituir a sociedade internacional de acordo com princípios aceitos por todos, incluindo consentimento e autodeterminação nacional.
O início destes objetivos foi confirmado pela Primeira Guerra Mundial, quando caíram impérios militares multinacionais. Entretanto, estavam acontecendo de forma errônea e seus princípios pareciam andar para trás. Através do comunismo, despertou-se o fascismo, houve revolução e contra-revolução, muitas vezes com políticas sem propósitos, que eram alimentadas por tráficos de armas e apoiadas por terroristas de outros países. Em outras situações havia até crenças na hierarquia racial. Pareciam-se cada vez mais com conflitos religiosos.
Todas estas guerras civis desarticulam o Sistema Internacional, pois trás um antigo sentimento nacional de superioridade sobre outros povos. As doutrinas revolucionárias incluem paixão e fanatismo à política e reinterpreta os interesses do Estado. E se o poder revolucionário demonstrar pouca chance de ganhar o governo, ele poderá tentar distanciá-lo do seu povo.
A política revolucionária desfaz a distinção entre diplomacia e espionagem. Ao usar este tipo de diplomacia, a tendência estará subordinada pela propaganda, ao invés de negociar seus interesses de forma cordial, seria influenciada pelas opiniões sustentadas por interesses.
A Revolução Internacional muda o caráter da guerra, pois está moral e psicologicamente em guerra contra os países próximos, tanto em tempos de guerra, quanto em tempos de paz. Muitas vezes a guerra não declarada transforma-se numa guerra de grande escala, pois a traição e o medo da traição constituem grandes marcas de um período de revolução internacional.
Geralmente estas guerras têm objetivos doutrinários e esperam não uma negociação, mas uma rendição incondicional, principalmente visando a queda do regime adversário. A política internacional não-revolucionária é considerada mais normal do que a revolucionária porque a primeira nunca se manteve durante muito tempo contra os interesses nacionais. Um dos objetivos da segunda tem sido dar força ao imperialismo de uma grande potência. Descrever revoluções internacionais e política do poder como “normais” é como emitir opinião de como deveria funcionar a política internacional, ou seja, seria ignorância em relação à doutrina e a manutenção da liberdade nacional.